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Restaurantes e indústrias investem em ações socioambientais a pedido dos clientes

A sustentabilidade e a consciência com a preservação do meio ambiente entraram de vez nas estratégias de gestão – e de marketing – de restaurantes e da indústria de alimentos, puxadas pelo interesse cada vez maior dos consumidores sobre o que há por trás destes negócios.

Se antes mais valia um produto com o preço mais em conta ou uma qualidade superior, hoje também é preciso mostrar às pessoas que o processo produtivo dele tem o menor impacto ambiental possível. E isso passa por tudo o que consumimos, como o pacotinho de snacks e a caixinha de leite longa-vida, o pacote de pão, o óleo usado na fritura das batatas-fritas e, até mesmo, a destinação final das sobras de comidas.

Esse movimento não é recente, já vem há pouco mais de uma década com a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que traz o conceito de responsabilidade compartilhada e a necessidade de um sistema de logística reversa para aumentar o retorno dos resíduos ao ciclo produtivo.

Mas, a consciência ambiental ganhou mais tração no Brasil nos últimos quatro a cinco anos, quando os próprios consumidores passaram a pesquisar como as suas marcas preferidas trabalhavam com a questão ambiental. Muitas delas já tinham medidas implementadas, outras vieram na esteira da preocupação dos clientes.

E não é para menos, dados recentes do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) mostram que o Brasil recicla apenas 2,1% dos resíduos coletados. É o mesmo porcentual registrado há três anos, o que mostra que pouca coisa mudou – enquanto que o interesse dos consumidores deu um salto neste meio tempo.

Para Isabela de Marchi, gerente de sustentabilidade da indústria de embalagens SIG na América do Sul, essa percepção de cobrança dos consumidores vem crescendo ano a ano, e é um caminho sem volta.

“Na Europa isso já é muito forte, mas aqui no Brasil a gente ainda tem uma dificuldade de desenvolver mais essa cultura. Mas, há sim essa importância e esse movimento do consumidor, da valorização [de medidas sustentáveis], de como a consciência do cidadão impacta diretamente nos produtos”, explica.

A própria SIG é uma das empresas que sempre foi alvo de questionamentos sobre a reciclagem das embalagens produzidas. Isso porque ainda há uma grande dúvida da população sobre o reuso das caixinhas longa-vida, que tem um processo diferente de um vasilhame de plástico ou de papel por conta das camadas de diferentes materiais usados.

No entanto, esse é o tipo de dúvida que precisa ser esclarecida junto de uma educação ambiental como um todo, como destaca Marcio Barela, coordenador de sustentabilidade da Cargill.

“Não adianta simplesmente termos um display [de recolhimento] perto da casa das pessoas ou do supermercado. Isso depende de um processo de cultura mesmo, de conscientização, de uma mudança de comportamento da população”, afirma.

É nesta falta de uma cultura e de programas públicos de incentivo à reciclagem e conscientização que as próprias empresas, sejam elas indústrias ou restaurantes, entram com suas próprias ações. Veja o que estes negócios têm desenvolvido no país para contribuir com a sustentabilidade:

Outback e Abbraccio
Por meio de uma parceria com a Cargill, as 75 lojas das duas redes de casual food fazem o rastreamento e a destinação de cada litro de óleo de fritura utilizado, recebendo uma receita pelo resíduo recolhido. A parceria faz parte do programa Ação Renove o Meio Ambiente, criado em 2010, que já recolheu mais de seis milhões de litros de óleo residual em 17 estados e no Distrito Federal — só na ação com o Outback e o Abraccio são cerca de 14 mil litros em média/mês.

Marcio Barela explica que o objetivo do programa é dar uma destinação correta do óleo de soja pós-consumo, onde o consumidor acaba descartando o resíduo na rede coletora doméstica.

“No começo o programa era mais voltado à pessoa física, em parceria com redes de supermercados, para os consumidores levarem de volta o resíduo. Assim o programa cresceu e passamos a oferecer também aos nossos clientes do food service”, conta.

Às redes, o programa é implementado através de processos de gestão dos resíduos, onde os funcionários são treinados a conhecerem as empresas coletoras credenciadas e a forma correta de descartar o óleo utilizado na cozinha. O resíduo é encaminhado como matéria-prima para a produção de produtos sustentáveis, como o biodiesel.

Burger King
O programa de reciclagem da rede já recolheu 180 toneladas de resíduos.| Renan Lima/divulgação BK Brasil
Na quinta maior rede de fast-food do Brasil, o projeto chamado de “Aterro Zero” promove a coleta, transporte, destinação final e valorização dos resíduos gerados em 15 lojas da marca. A ação criada pela BK Brasil e a Ambiensys Inteligência em 2019 coletou 180 toneladas de materiais orgânicos e recicláveis, dos quais 105 geraram subprodutos que foram reinseridos no mercado.

Entre esses materiais estão resíduos orgânicos para compostagem e rejeitos para a geração de energia para a fabricação de cimento (coprocessamento). Segundo Fábio Alves, vice-presidente jurídico da BK Brasil, a ação se soma à eliminação dos canudos de plástico nas lojas, desde 2018, e das caixinhas de papelão de alguns dos lanches a partir de 2020.

“Seguimos buscando formas de inovar e acelerar o conhecimento do nosso impacto ambiental no país. Com o projeto Aterro Zero, temos como objetivo direcionar os resíduos utilizados em nossos restaurantes de modo que eles retornem para o meio ambiente de forma segura e sustentável”, explica.

Ação semelhante vem sendo desenvolvida na marca Popeyes, de propriedade da holding, onde os canudos de plástico e as caixinhas de papelão também foram retiradas das operações.

Logística reversa de embalagens
A coleta de embalagens é feita através da compensação monetária às cooperativas e institutos de coleta de resíduos.| Daniel Castellano/arquivo/divulgação SMCS
Entre os materiais mais difíceis de se coletar na logística reversa estão as pequenas embalagens de snacks e de longa-vida, por serem todas descartadas pelas pessoas nas mesmas lixeiras. Ou seja, algo que uma determinada empresa não consegue ter um controle efetivo sobre todos os seus resíduos jogados fora pelos consumidores.

Para isso, as marcas firmam parcerias com ONGs e cooperativas que fazem a coleta desses materiais e as compensam monetariamente de acordo com o porcentual de embalagens colocadas no mercado e recolhidas por elas – este recolhimento independente da indústria geradora.

É algo como uma compensação pelo que é despejado no mercado, como as cerca de 30 toneladas recolhidas mensalmente pela indústria paranaense Jasmine Alimentos. Segundo Rodolfo Tornesi Lourenço, diretor de inovação e transformação, as cooperativas firmam contratos de parceria com diversas empresas e saem às ruas para capturar de volta as embalagens de acordo com o que foi contratado.

“É um acordo que temos com eles, que pegam de outras marcas e acabam compensando de várias das empresas contratantes. Isso porque é impossível capturar exatamente as embalagens da Jasmine”, explica.

A empresa tem parceria com o Instituto Paranaense de Reciclagem (Inpar) desde 2017, e com a Eu Reciclo desde o ano passado. É a mesma estratégia utilizada pela SIG com as embalagens longa-vida, feitas de papel cartonado e outros materiais, desde 2018.

Sede da ação de reciclagem da SIG em Curitiba.| divulgação/SIG
Naquele ano, a marca fez uma parceria com a ONG Recicleiros para promover essa logística reversa de embalagens em 16 cidades brasileiras, e mais recentemente, em 2019, criou o programa So+ma Vantagens, onde os coletores acumulam pontos pelos materiais capturados e depois trocam por produtos diversos do dia a dia. Este segundo é um projeto piloto desenvolvido em Curitiba que deve ser estendido para o restante do país em breve.

“Tudo o que tem valor para os catadores é recebido na casa [a cooperativa Corbélia, em Curitiba], como todo tipo de embalagem, óleo de cozinha, lixo eletrônico, tudo o que eles conseguem comercializar. Esse material é doado para os catadores e eles vão acumulando pontos e trocam por recompensas”, explica Isabela de Marchi.

O programa já recolheu mais de 205 toneladas de resíduos e 12,5 mil trocas de recompensas para os catadores de 600 famílias.

Resíduos de panificação
Já no setor de food service, a indústria de panificação Bimbo começou recentemente a beneficiar os resíduos gerados pela produção da fábrica de Gravataí (RS), em um programa também chamado de Aterro Zero. A marca afirma que consegue reprocessar 100% das 84 toneladas de resíduos geradas mensalmente, promovendo uma economia circular do produto.

“Evitamos impactos ambientais e ajudamos a gerar mais empregos e renda na comunidade onde operamos”, afirma Mário Escotero, diretor de gestão de pessoas, comunicação, jurídico e assuntos corporativos da Bimbo Brasil.

Por Guilherme Grandi
Foto: Bigstock

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